sábado, 6 de fevereiro de 2010

OS DEUSES MODERNOS - ÍDOLOS DE BARRO



Decorrido algum tempo, aqui me têm de regresso, novamente. Após as digressões alinhavadas no texto anterior, retorno à minha praia. Ressabiado, talvez, por ter me transmudado de pato a ganso, como anatematiza a sabedoria popular. Sabia, de antemão, que estava a semear no deserto. Daí porque enfoco, hoje, temática mais amena e atualíssima. Conforme sugere o título, o assunto diz respeito à deificação, ao endeusamento de criaturas cujo mérito consistia ou consiste no ótimo desempenho das atividades que elegeram, mas cuja prática nada acrescenta nem traz qualquer benefício para nós, pobres mortais. Claro está que eles sobrelevam aos demais cristãos, na seara escolhida, fato que sobremaneira os dignifica e enaltece. Exemplos: Ronaldinhos, Madonas,Adrianos, Robertos Carlos, Byoncés, Xuxas e tantos outros...É bem de ver que as profissões onde sobressaem e despontam tais "divindades" são essencialmente popularescas. Quer dizer, justamente onde a massa de manobra - que é a plebe ignara - pode ser conduzida, embretada qual rebanho, rumo ao curral do sacrifício.Enquanto isso - e paradoxalmente - figuras relevantes, tais como sábios, benfeitores da humanidade, cientistas que se desdobraram no estudo e na solução dos cruciantes problemas que afligem a humanidade, trazendo luz à escuridão, esses são perfidamente relegados às sombras do anonimato! Atente-se bem para o circunstancial de que, por detrás dessas artimanhas, da prefabricada popularidade desses apedeutas, existe a mídia, uma monstruosa máquina montada para o incensamento desses falsos ídolos, propagandeando eventos e faturando $ifrões em cima disso. Assim, através de fantasiosos epitetos ultra criativos, são exalçados ditos medalhões: é o "fenômeno" aqui, o "rei" ali, a "diva" acolá, o "imperador" sei lá de onde... Exageros à parte, evidencia-se, aqui, o fato de que são todos, in genere, ídolos forjados por verdadeira máfia, subprodutos do meio, com profundas raízes e naturais reflexos no social, constituindo pernicioso exemplo para as novas gerações. As grandes cadeias de rádio, jornal e televisão,entoam cânticos e hinos de louvor a essas pseudos majestades, enchendo as burras e se locupletando com a gananciosa venda de caríssimos ingressos para a turba, legião de fanatizados, através do reiterado e extemporâneo trombeteio de tais espetáculos.Existe uma poderosa emissora que transmite vinte e quatro horas por dia, sendo que, dessas, vinte duas são berrarias alusivas a noticiosos de futebol e eventos popularescos. Agora, então, ante-véspera da copa do mundo, só se fala em futebol, como se fosse assunto de natureza primordial. Entorpecem o populacho e atravancam o País. Ninguém mais trabalha! Enquanto isso, assuntos prioritários tais como segurança pública, saúde, saneamento básico, educação, impostos escorchantes, corrupção e politicagem eleitoreira são relegados a um segundo plano... Então, a patuléia, sôfrega, aplaude e acorre em bandos, em gritedos histéricos e beberagens desenfreadas, causando acidentes, balbúrdia e incríveis congestionamentos de trânsito, tumultuando a vida citadina. Os estádios futebolísticos ficam abarrotados de gente. Os palcos e seus planetóides, com água pela barba, a plebe urrando e pululando em trejeitos simiescos, em rocambolescos requebros, ao som de música americanizada e sob o estribilho de letras analfabéticas, num inglês que poucos entendem. A ingênua juventude, essa, então, com a mente ainda mal formada, acode em massa a tais chamariscos, influenciada pelo espírito imitativo, vulgar modernismo e, sobretudo, vitimada pela sobrecarga do alarido feito pelos venais agentes publicitários. É um salve-se quem puder! Entrementes, os falsos deuses - ídolos de barro - aterrissando em suas aeronaves espaciais, recobertos de plata e rindo à toa, estufam o peito, envaidecidos, engalanados e ciosos da sua ilusória nobreza e divindade, a exigir mundos e fundos para seu deleite e aprazimento. Adornados e acobertados por excêntricos e frívolos caprichos,são entronizados em suntuosas acomodações, banhados em aquosas essências espumantes, sorvendo leite de cabra e abocanhando pitéus estapafúrdios. Travestidos pelos ouropéis mais belos e do alto do seu majestoso trono, se esbaldam em risos histriônicos e escárnios zombeteiros, com pena dos boquiabertos e embasbacados súditos aqui debaixo, babando na planície.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ótimo texto, e bem apropriado para o momento! Bem-vindo de volta ao mundo das letras! Abração